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O PODER DO DESENHO PARTICIPATIVO

Fernando Luiz Lara. Arquiteto graduado pela UFMG em 1993. PHD pela University of Michigan, EUA em 2001. Professor Titular da Escola de Arquitetura da UFMG e associado da University of Texas, EUA

Não é difícil defender a necessidade de planejamento e detalhamento na gestão dos espaços urbanos. Basta andar por qualquer rua de qualquer cidade brasileira e perceber que a calçada reformada no ano passado já foi cortada para reparos numa rede qualquer. A cicatriz resultantO PODER DO DESENHO PARTICIPATIVOe é visível no cimento mal acabado do remendo, e o estrago maior é nas contas públicas que gasta o mesmo recurso diversas vezes sem alcançar o objetivo maior que é de termos uma cidade melhor. E o diagnóstico, banal de tão simples, é que falta projeto.

O projeto, simples representação bi-dimensional da realidade (agora facilmente executável também em três dimensões em ambiente virtual) serve justamente para antecipar problemas. Os milhões de brasileiros que trabalham em algum setor da indústria da construção sabem que depois de construir algo (seja uma casa, uma calçada ou um banco de praça) é fácil construir outro exemplar. A construção funcionou assim por milhares de anos até que fosse inventado o desenho em perspectiva na Itália do século 15 e a geometria descritiva no século 18. O que estas duas ferramentas de representação criaram foi a possibilidade de se manipular o espaço tri-dimensional e antecipar resultados usando apenas papel (hoje em dia basta energia na forma de clicks, bits e pixels). O projeto se tornou uma forma de se construir melhor, de se evitar erros, de se prever com detalhes o resultado de qualquer intervenção. Quanto melhor o projeto, não apenas no sentido de representação final mas de estudo, investigação, invenção, melhor o resultado.

Também não é difícil defender a necessidade de um projeto melhor. É fácil olhar para a Europa e os EUA comparar suas praças e edifícios com os nossos. Menos fácil é olhar para a Colômbia, Uruguai ou Costa Rica, países com menos recursos que o Brasil e com uma qualidade de construção visivelmente melhor. O segredo nos três casos acima reside no investimento em planejamento e projeto. Os três países latino-americanos estão conseguindo construir cidades de qualidade europeia com recursos muito mais limitados, com criatividade e rigor no planejamento e no projeto das obras.

Um espaço bem projetado e bem construído tem várias vantagens. A mais óbvia delas é não precisar de reforma tão cedo e cumprir efetivamente as funções para as quais foi pensado. Outra vantagem é melhorar a auto-estima da população. O caso de Medellin na Colômbia é emblemático, assim como as diversas obras de melhoria em favelas brasileiras. Um espaço público bem projetado tem inclusive impacto na saúde ao se estimular a prática de atividade física e se evitar os problemas causados pelo mofo, águas paradas, melhoria da acessibilidade etc.... Outra intercessão importante entre um espaço público bem projetado e um tema urgente diz respeito a segurança pública: uma praça sempre bem utilizada é muito mais segura que uma praça semi-abandonada, o mesmo valendo para áreas comuns de edifícios residenciais.

Tudo isto não implica necessariamente num orçamento maior. A metáfora que resume o custo do desenho urbano é pensar o projeto como a compra de um carro usado. Como todos nós sabemos, comprar um carro usado simplesmente pelo menor preço é um convite a dor de cabeça por causa da elevada complexidade. É preciso ver a história anterior do escritório, avaliar a capacidade de cumprir prazos e orçamentos, valorizar a experiência da equipe sua dedicação a projetos de espaços públicos e habitação coletiva. Nem todo metro quadrado de grama é igual, nem todo metro cúbico de concreto é igual. É preciso analisar muito bem cada caso e projetar cada espaço para corresponder a sua função social e sua função ambiental. Desenho qualquer um faz por qualquer preço mas isso implica necessariamente problemas de todo tipo desde a execução da obra até a manutenção futura dos espaços.

Um bom projeto é o primeiro passo para garantir uma obra sem percalços e o efetivo uso pela população. Um bom projeto é o primeiro passo para uma cidade mais sustentável em todas as suas esferas: ambiental, social e econômica.