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SOLUÇÕES ARQUITETÔNICAS PARA ESCOLAS PÚBLICAS EM ÁREAS CARENTES

 

Autor: Marcelo Palhares Santiago, arquiteto urbanista, diretor da Horizontes Arquitetura e Urbanismo. Especialista em gestão de projetos de engenharia.

“ Comecemos pelas escolas, se alguma coisa deve ser feita para “reformar” os homens, a primeira coisa é “formá-los”. Lina Bo Bardi em Primeiro: escolas. Habitat, n°4, 1951

O principal instrumento para construção e desenvolvimento de um país é a educação de seu povo. O Brasil, apesar de apresentar maior desenvolvimento econômico, se comparado a outros países pobres, ainda apresenta baixo nível no desempenho escolar e altos índices de analfabetismo. Para resolver este problema, não há dúvidas sobre a importância de aumentar os investimentos públicos no setor da educação visando ampliar o acesso da população às escolas.

Neste sentido, a contribuição dos arquitetos e engenheiros se dá pelos projetos e construção de escolas e universidades.

Existem diversos estudos que analisam a relação entre a qualidade da arquitetura escolar e o ensino. Estes estudos avaliam como a forma dos espaços, aspectos estéticos,  relação entre espaços, infraestrutura e equipamentos podem interferir positivamente ou negativamente no aprendizado. A pedagoga Tatiane Menezes Santana cita dois autores na obra “A relação da arquitetura escolar com a aprendizagem”, evidenciando a importância do projeto de arquitetura para a educação:

“Hélio de Queiroz Duarte ressalta que o projeto arquitetônico de uma instituição de ensino deve ser subordinado, em primeiro lugar, à criança. (...) Ele afirma que as escolas deveriam ser alegres e acolhedoras, não podiam, portanto, assemelhar-se a prisões com muros altos e janelas inacessíveis, realidade de alguns colégios brasileiros.”

“O educador Eduardo D’Amorim afirma que, Tudo na escola deve ser feito para educar. Tudo. Assim, a sujeira deseduca, o abandono deseduca, a desorganização deseduca. Por outro lado, a limpeza educa, a organização educa, as paredes educam, os quadros educam, as plantas educam. Por isso a estrutura física para mim é importante para a visualização da seriedade do processo e da concepção que se tem da escola.”

Sensações proporcionadas pela arquitetura como conforto bioclimático, facilidade de circulação, qualidade estética, dentre outros aspectos, são de extrema importância para proporcionar ambiente agradável e condições ideais para concentração e bom desenvolvimento escolar. As soluções arquitetônicas que proporcionam as qualidades acima são bastante estudadas e difundidas, apesar de nem sempre aplicadas pois, muitas vezes, o custo é o principal item avaliado pelo cliente.

Os governos, em sua maioria, optaram por atacar o problema da carência das escolas pela redução de custo e construção de muitas unidades, deixando a qualidade espacial e estética em último plano.

Na maioria dos estados, as secretarias de educação desenvolveram projetos padrões que são replicados indistintamente em qualquer situação. Estes projetos padrões apresentam dois grandes problemas: primeiro não são adaptáveis às realidades sociais e físicos ambientais locais e, segundo, foram desenvolvidos com soluções que prezam a redução do custo e ignoram a qualidade espacial.

Uma rápida análise desta postura mostra que as soluções para redução do custo que se estabeleceram como regras são a redução de área construída (prejudicando o conforto) e simplificação dos materiais de acabamento. Mas a redução de área nem sempre é a melhor maneira de reduzir custos, pois a relação de diminuição de custos e área não é direta como se acredita. Além disso, a simplificação de materiais acarreta maiores custos de manutenção no longo prazo e prejudica o desempenho geral do edifício.

Outro fator que têm grande influência no custo obra é o preço do terreno. Para diminuir os custos, os governos escolhem os terrenos mais periféricos e baratos, afastados da comunidade, consequentemente aumentando os custos públicos com infra estrutura e aumentando as despesas da população com transporte. O correto seria priorizar a localização central e facilitar o acesso às comunidades.

O problema é que os terrenos centrais são mais caros. Então, como construir com qualidade espacial, em bairros centrais (próximos às comunidades) e mantendo os orçamentos sob controle?

Em geral, os arquitetos e engenheiros não são capacitados para prever os custos das decisões de projeto. Por isso, raríssimas vezes a redução de custos da obra é feita através do estudo das formas geométricas. Assim, se torna essencial aos arquitetos se armarem de técnicas e ferramentas que possibilitem conceber projetos criativos e ao mesmo temo entender o impacto financeiro de cada decisão.

Para tentar demonstrar que é possível desenvolver projetos de escolas priorizando a qualidade espacial, e ao mesmo tempo pensando nos limites de orçamento, o arquiteto Marcelo Palhares Santiago desenvolveu um estudo comparando as soluções volumétricas de dois projetos de escolas públicas com programas equivalentes, mas desenvolvidos a partir de dois padrões distintos (Escola padrão DEOP-MG X Sistema FDE-SP).

Os projetos de escolas utilizadas na comparação foram: Escola 12 salas de aula padrão DEOP-MG (Rio Pardo de Minas-MG) e Escola 12 salas de aula padrão baseada no Sistema FDE-SP (Juiz de Fora-MG).

A escola padrão DEOP MG contém três edifícios separados: escola, quadra e vestiário. O edifício de salas de aula é dividido em dois blocos horizontais de dois pavimentos, interligados por um bloco central que contém escada, elevador e caixa d’água, cobertos por telhas cerâmicas. O sistema estrutural é de concreto armado moldado in loco e fechamento em alvenaria. A quadra coberta é um elemento independente, construído com estrutura e cobertura metálicas, arquibancada de concreto e fechamento em grade.  O vestiário também é um edifício independente, resolvido em estrutura convencional de concreto e fechamento em alvenaria, com cobertura de laje plana impermeabilizada.

A implantação do projeto padrão DEOP MG exige terrenos amplos para locação dos três blocos, de forma a permitir afastamentos mínimos entre os blocos e afastamentos com as divisas do terreno. Para permitir acessibilidade entre os blocos, estes devem ser implantados em cotas de nível próximas, evitando desníveis que demandem a construção de arrimos e rampas. Neste modelo, a ocupação de terrenos com alta declividade é dificultada e encarecida, sendo mais viável nos terrenos planos.

A escola Dom Bosco, desenvolvida para a prefeitura de Juiz de Fora - MG, foi feita com base no sistema proposto pela FDE-SP.  A escola foi resolvida em um bloco único com três pavimentos. No pavimento intermediário ficam laboratórios, secretaria/administração, cozinha/refeitório, biblioteca, sala de computação e pátio coberto. No pavimento inferior ficam as salas de aula e no último pavimento ficam o vestiário e a quadra.

A cobertura é única, em telha metálica. A circulação vertical é feita por dois blocos de escadas internos e por elevador. A estrutura é em pilares pré-fabricados de concreto, com fechamentos em alvenaria e brises metálicos.

A solução verticalizada do Sistema FDE-SP permite implantação em terrenos pequenos e acidentados devido à sua forma compacta e devido à possibilidade de apoio em estrutura suspensa do solo.

A comparação foi feita com base em parâmetros desenvolvidos no livro “O custo das decisões arquitetônicas”, organizado pelo Engenheiro Juan Luis Mascaró:

  • Área mínima de terreno necessário para construção;

  • Eficiência da forma da planta (quanto menos superfícies verticais mais eficiente);

  • Eficiência do volume (altura X área da planta; quanto mais próximo do cubo mais eficiente);

  • Eficiência das circulações verticais (quantidade de escadas e elevadores X área da planta; quanto menos circulações mais eficiente);

  • Eficiência das circulações horizontais (comprimento das circulações X área da planta atendida; quanto maior a área atendida por cada m linear de circulação mais eficiente);

  • Índice de compacidade (perímetro X superfície construída da planta; quanto mais próximo do quadrado melhor).

De acordo com os cálculos realizados no estudo a escola desenvolvida no Sistema FDE-SP tem soluções volumétricas mais eficientes que o padrão DEOP-MG. Os maiores impactos negativos do padrão DEOP-MG se dão pelo baixo índice de compacidade (perímetro elevado em relação à área), corredores pouco compactos e pelo alto custo necessário para compra de terrenos amplos e planos.

O padrão DEOP-MG, apesar de ter quase 40 anos, é considerado, pelo governo do estado de Minas, um modelo de baixo custo e fácil repetição por utilizar sistema construtivo convencional (concreto armado in-loco e fechamento em alvenaria) e de baixo padrão tecnológico. Mas, além da baixa eficiência econômica de sua volumetria, esta solução 'ultrapassada' demonstra a pouca preocupação com evolução tecnológica, capacitação da mão de obra e melhoria da qualidade espacial da escola.

Este estudo exemplifica a aplicação da metodologia desenvolvida por Mascaró para análise da tipologia escolar. No entanto, este conhecimento e o uso destas ferramentas podem ser fundamentais para os arquitetos em qualquer tipo de projeto. Estas ferramentas capacitam o arquiteto a compreender melhor a influência e impacto de cada solução projetada, permitindo que o profissional possa avaliar e escolher, entre as diversas opções que surgem durante a fase de concepção, as soluções que sejam mais eficientes economicamente.

O arquiteto que acumular o conhecimento dos índices de compacidade às suas habilidades técnicas, terá ampliada sua capacidade de tomar decisões gerenciais na fase de projeto.

Clique aqui para baixar o artigo completo.

Fontes: 

  • Projeto Dom Bosco: Horizontes Arquitetura e Urbanismo;

  • Escola Estadual Norberto de Almeida Rocha, Local: Rio Pardo de Minas. Foto: Gil Leonardi/Secom MG. Projeto de implantação: Horizontes Arquitetura e Urbanismo;